Há algum tempo vinha de Aracaju, onde fui visitar meu filho Fábio e sua família, e na escala no aeroporto de Brasília parei, como de hábito, na livraria da Editora da Universidade de Brasília, onde achei um livrinho de 30 páginas “Universidade pra que?”. Uma preciosidade. É a íntegra do discurso do antropólogo Darcy Ribeiro, o primeiro reitor da UnB e o seu fundador, em 1962, por ocasião da posse do primeiro reitor eleito depois do regime militar, atual senador Cristovam Buarque, em 1985.
Darcy Ribeiro é um desses espíritos muito além do seu tempo, e um brasileiro idealista. A UnB foi um desses sonhos extraordinários. Fui aluno lá até 1968 e ainda hoje me encanto com no projeto futurista da universidade naqueles distantes anos da década de 1960. O sonho da UnB era criar o núcleo de uma civilização nacional partindo do centro do país, na esperança de que ela no futuro alcançasse o país como aquele círculo formado pela água quando cai nela uma pedra.
Vou pinçar algumas de suas frases: “Precisávamos de uma universidade-semente capaz de gerar um desenvolvimento que o país não tem...”. “...A velha universidade estava em crise. Não tinha padrões(...) a nos oferecer. (...) éramos, pois livres, e estávamos desafiados a pensar”. “Nós nos recusávamos a aceitar a universidade de mentira que se cultivava no país, tão inconsciente de si como contente consigo mesma”. “A UnB é a ambição mais alta da inteligência brasileira, este é o nosso sonho maior, esta é a utopia de quem entre nós tem cabeça pra pensar este país e senti-lo com o coração”. “O Brasil, entendido como o seu povo e o seu destino, é o nosso tema e o nosso problema”.
Gosto muito dessa frase profética: “No Rio de Janeiro contava-se com uma cultura erudita arraigada que lá podia dar esclarecimentos, antes que qualquer decisão fosse tomada, por qualquer potestade. Aqui no pasto goiano, onde e com quem os poderes vão se informar? Com as vacas magras e chifrudas que pastam no cerrado?”
Em certo momento, Darcy rememora o projeto de Brasília e o da própria UnB, quando lembra que até então o Brasil do litoral, que dominava o Brasil inteiro, era uma caricatura e uma cópia piorada da Europa. Brasília seria o início da construção de um Brasil novo a partir de si mesmo, capaz de, aos poucos, contaminar o Brasil com uma nova brasilidade.
Darcy Ribeiro estava certo. Hoje o Centro-Oeste já configura o início de uma civilização brasileira baseada no trabalho, na mistura de todas as suas raças e num desejo de futuro que não se vê unânime no país. Fruto da utopia de Brasília, concebida por uns sonhadores como Juscelino Kubitscheck, Darcy Ribeiro, Lúcio Costa, Oscar Niemeyer e tantos, todos já vivendo em outro plano espiritual. A nós, resta sonhar com o sonho deles e fazer o possível na direção da utopia de 1960...!