Havia um tempo que era pejorativo chamar alguém de índio ou morar na terra, ainda, deles.
Nasci, fui educado, estudei e, quando tive oportunidade, tentei apagar esse preconceito.
Como o índio morava na selva, hoje quase em extinção, denominei de “Universidade da Selva” a burocrática Universidade Federal de Mato Grosso, isso em 1971, durante o Primeiro Encontro dos Reitores das Universidades Públicas em Brasília.
Era a nossa meta de intenções para esta parte do Brasil - tão cobiçada pelas nações estrangeiras!
O primeiro marco da nova casa de ensino superior foi o Museu Rondon, em homenagem ao grande pacificador das etnias existentes em nosso Estado.
Para meu orgulho sou filho do “Bugre do Bar”, apelido que o meu pai ganhou pela cor indígena da sua pele.
Percorri toda a área de atuação da Missão Anchieta ao norte do nosso Estado, cuja sede ficava localizada em Utiarity.
Seus membros eram jesuítas, e desenvolveram um trabalho extraordinário durante o choque inevitável dos homens brancos, dito civilizados, com os povos não aculturados.
Muitas mortes foram evitadas, porém, o número de mortos quase dizimou civilizações inteiras.
Aprendi muito também com os irmãos Villas-Bôas, com Apoena e com Chico Meirelles.
Todos foram contratados como professores colaboradores da nossa incipiente UNISELVA.
Fui médico de índias e operei algumas delas. Posteriormente, tivemos conosco na UNISELVA o saudoso cacique Mário Juruna, de quem recebeu o seu famoso gravador. Brizola, que era a favor do respeito às minorias, o elegeu Deputado Federal pelo Rio de Janeiro, a eterna capital da cultura brasileira.
Diante de tanta sabedoria e felicidade que encontrei nesses povos das florestas, sempre indagava o motivo de terem lhes tirado quase tudo. Bens materiais e imateriais. Afinal eles eram os verdadeiros donos.
Certa ocasião, assistindo no Xingu o Quarup, em homenagem a Noel Nutels, o russo médico dos índios, Cláudio respondeu a minha pergunta inquietante sobre a razão de tanta felicidade dos povos ainda não aculturados.
“Eles não conhecem o dinheiro, nem o casamento, nem a propriedade”, disse-me o antropólogo do mato.
“Não tinham noção da posse das coisas ou pessoas”.
“Fico imaginando - continuou o pensador - até que ponto foi ‘negócio’ comprarmos, massacrando os verdadeiros donos das terras, o conforto, a riqueza material em troca da felicidade perdida.”
Como era bom ter nascido no Brasil antes de 1500, e ser chamado de índio!
Gabriel Novis Neves é mèdico em Cuiabá e ex-reitor da UFMTPlantão News.com.br - 2009 Todos os Direitos Reservados.
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