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Economia
Quarta, 10 de fevereiro de 2016, 06h56

Desafios para a igualdade no mercado de trabalho


omo a discrepância de oportunidades enfrentada pelas mulheres no mundo profissional está vinculada a seu papel social de reprodução da vida.

A participação da mulher no mercado de trabalho vem crescendo nos últimos anos, fenômeno que é observado pelas pesquisas do IBGE (PNAD) e do Dieese/Seade (PED). Estima-se que, em 2014, de cada 100 mulheres em idade ativa, 51 estavam no mercado de trabalho. Comparada à inserção dos homens, para os quais de cada 100 em idade ativa havia 72 ocupados, ainda existe uma grande diferença em relação à participação das mulheres.

Observa-se que a participação feminina no mercado de trabalho enfrenta iniquidades a serem superadas. Uma das desigualdades se refere à remuneração, pois, em média, as mulheres recebem 75% do que ganham os homens, distância que vem diminuindo (em 2004 era 63%).

Essa desigualdade ocorre porque as mulheres ocupam postos de trabalho que pagam menores salários, alguns tipicamente femininos; porque há empregos tipicamente masculinos que pagam melhor e aos quais as mulheres não tem acesso; porque elas têm maior dificuldade para ascender aos postos de direção ou aos melhores empregos, entre tantos outros motivos. Entretanto, quando há igualdade de oportunidades no acesso ao posto de trabalho, observa-se que as mulheres superam essa desigualdade, como no caso de concursos públicos ou quando a empresa tem políticas de igualdade de gênero.

A desigualdade de oportunidades no mercado de trabalho enfrentada pelas mulheres é consequência de outra. A função social de reprodução da vida as coloca em condição de inferioridade, pois a maternidade é um fator que ainda impede, de forma velada ou explícita, que acessem postos de trabalho. Além disso, em uma sociedade na qual os cuidados com a família e as atividades domésticas não são compartilhados, as mulheres assumem, quase exclusivamente, essas tarefas, o que torna praticamente impossível que elas tenham a mesma assiduidade ao trabalho que os homens e, por isso, sofrem discriminação por parte das empresas.

Deve-se considerar também que a dupla jornada de trabalho exercida pelas mulheres é funcional para o capital, pois as atividades domésticas realizadas por elas não são remuneradas. O conceito de trabalho produtivo está relacionado às atividades que resultam na produção de bens ou serviços com valor econômico e que são contabilizadas no cálculo do PIB. O trabalho reprodutivo inclui uma série de atividades que permitem a sobrevivência e reprodução da família, que precisam ser renovadas a cada dia e possibilitam o funcionamento da sociedade e a reprodução da força de trabalho. Esse trabalho continua invisível à luz das estatísticas e dos levantamentos de atividades consideradas “econômicas” e é considerado “um não trabalho produtivo”.

Dados do IBGE (Síntese de Indicadores Sociais) de 2014 indicam que a jornada de trabalho total das mulheres é de 56,7 horas por semana, sendo 35,5 horas relativas ao trabalho principal e 21,2 horas destinadas a afazeres domésticos. Em 2004, 91,3% das mulheres ocupadas realizavam afazeres domésticos e de cuidados. Em 2014, eram 90,7%. Entre 2004 e 2014 o número de homens ocupados que realizam afazeres domésticos subiu de 46,1% para 51,3%, mas ainda é muito inferior ao observado entre as mulheres.

Para criar as condições de oportunidades de acesso ao mercado de trabalho, é preciso que o Estado adote políticas públicas que possibilitem a igualdade de condições na vida cotidiana, com a oferta de equipamentos públicos de qualidade e em quantidade suficiente para atender à demanda (creches, educação infantil e básica em tempo integral, lavanderias públicas, restaurantes, dentre outros).

Para evitar que algumas destas iniciativas reforcem a tradicional divisão sexual do trabalho e a reprodução das desigualdades, elas devem ser direcionadas a homens e mulheres, considerando-os igualmente responsáveis pelas tarefas domésticas e pelos cuidados com familiares. Por outro lado, em um contexto de construção da corresponsabilidade pelas atividades domésticas e busca de equilíbrio entre a vida laboral e a vida familiar, essas reivindicações devem ser assumidas por homens e mulheres.

Nas empresas, por sua vez, é necessário que haja uma cultura organizacional que valorize o equilíbrio entre trabalho e vida familiar. É necessário também que haja a participação dos funcionários de ambos os sexos e de suas organizações na definição de medidas a serem adotadas. O desafio fundamental é lutar pela igualdade de oportunidades de trabalho e salários para homens e mulheres, pelo aumento e igualdade na licença paternidade e maternidade, para que as empresas garantam – para homens e mulheres – tempo para desempenharem suas responsabilidades familiares.

O modelo tradicional de conciliação entre trabalho e família, ou seja, homens inseridos no mercado de trabalho e mulheres responsáveis pelas atividades domésticas e de cuidados, não responde mais ao cenário atual, pois importantes transformações aconteceram no interior das famílias e no papel que as mulheres desempenhavam dentro delas. O número de famílias chefiadas por mulheres vem aumentando, assim como os arranjos familiares monoparentais com filhos/as, que não contam com a renda de dois cônjuges, tem menor renda familiar e estão mais vulneráveis à pobreza.

Não há como superar a desigualdade de gênero no mercado de trabalho sem criar uma nova relação social, sem avançar no equilíbrio da distribuição das tarefas domésticas e responsabilidades nos cuidados com a família. Isso requer valorizar o trabalho reprodutivo, garantir equipamentos públicos de apoio à conciliação entre o trabalho e a vida familiar e pessoal, o reconhecimento como trabalho não remunerado a atividade doméstica, a redistribuição das atividades de cuidado entre homens e mulheres, entre as famílias, o Estado, o mercado de trabalho e a sociedade.

*Clemente Ganz Lúcio é sociólogo, diretor técnico do Dieese e membro do CDES, Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Maysa Dias Garcia é socióloga e consultora. 

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