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Nacional
Quinta, 20 de outubro de 2016, 18h15

Questão de terras indígenas em Alagoas volta à 1ª instância após quase 10 anos


Depois de quase 10 anos de processo judicial para definir a demarcação de terras indígenas da etnia Kariri Xocó, de Alagoas, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) decidiu nesta quinta-feira (20), anular a sentença de 1ª instância concedida em favor dos indígenas e devolver os autos para recomeçar o andamento do caso.

O desembargador relator Paulo Machado Cordeiro já havia votado favoravelmente à demarcação no dia 28 de agosto, mas houve divergência e a análise do caso precisou ser feita numa sessão ampliada, com cinco desembargadores. Na retomada do julgamento, nesta manhã, ele reconfirmou seu voto, mas três desembargadores discordaram e pediram que sejam realizadas mais instruções para colher depoimentos de agricultores e outras evidências, com o objetivo de garantir o amplo direito de defesa dos produtores rurais que atualmente ocupam a área.

O primeiro a discordar, já no julgamento de agosto, foi o desembargador Cid Marconi. Ele sustenta que não houve espaço para defesa dos fazendeiros que recorreram da demarcação, embora reconheça que o processo “demorou muito” e que houve “equívoco” da Justiça em prolongar a ação por quase uma década.

Marconi argumentou no seu voto que “embora tenha sido feita perícia judicial com a produção de um laudo antropológico, no qual se afirmou que a área pode ser considerada de ocupação tradicional', a questão deveria ser devolvida à primeira instância, para “ouvir as testemunhas, oportunizar as partes a juntar documentos, levantar moradores da área, outras perícias que sejam necessárias, observando o contraditório e o direito a ampla defesa das partes envolvidas”.

Um grupo de cerca de 50 indígenas viajou de Alagoas para Recife a fim de acompanhar o julgamento, levados pelo Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas. A professora Denízia Cruz, liderança da etnia Kariri Xocó, criticou o prolongamento do processo. “Estamos muito tristes, porque a gente esperou 10 anos e queríamos uma decisão. Os desembargadores cometem um equívoco. A gente volta para a comunidade muito indignada. Vamos esperar mais 10 anos?”.

Disputa

Os Kariri Xocó residem numa área de 699 hectares no município de Porto Real do Colégio, Alagoas, desde 1978 , quando eles ocuparam uma fazenda-modelo da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba, localizada no território em disputa. Em 1979, a instituição doou o terreno aos indígenas e, em 1993, o governo federal reconheceu oficialmente o direito dos índios sobre a fazenda e outras terras já pertencentes a eles.

A etnia sustenta, no entanto, que a área a ser demarcada é de 4.413 hectares, englobando uma região ocupada por produtores rurais não-indígenas. O processo administrativo para o reconhecimento do direito dos Kariri Xocó sobre o território foi aberto pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em 2001, e uma decisão do órgão, favorável ao pleito, saiu em 2006.

Inconformados com a decisão, proprietários de cinco fazendas que ocupam a maior parte da área em disputa entraram na Justiça contra o parecer da Funai em 2007. Desde então, o processo se estende sem resultado definitivo. Em 2013, a 12ª Vara Federal de Alagoas decidiu que acompanharia a decisão da Funai, mas o grupo de fazendeiros voltou a recorrer.

Ocupação questionada

O advogado Jairo Silva Melo, que representa os proprietários, sustenta que não há evidências de que os indígenas ocupavam tradicionalmente toda a área, e que só há registro de cerca de 170 moradores da etnia na Rua dos Caboclos, na zona urbana. Ele também argumenta que cerca de 100 famílias – na sua maioria de agricultores familiares que ocupam uma pequena parcela da terra reivindicada pelos Kariri – estão na área há gerações e sairiam prejudicadas com a demarcação.

“Não existe nos autos qualquer documento oficial ou estudo que demonstre que nesses 300 anos existiu um só indígena nessa área que está sendo objeto de demarcação. Quer doar a terra aos índios, como foi doado, que se doe, que se compre [a terra] e doe. Mas [não pode] querer forçar que essas terras sejam caracterizadas [como] tradicionalmente indígena”, argumenta o advogado.

Tanto o advogado dos indígenas quanto a Advocacia Geral da União rebateram a afirmação de Melo citando trechos do laudo da Funai e outros documentos que atestariam a presença dos Kariri Xocó na região. A procuradora regional federal Marília Moraes, que defende a Funai no processo disse que trechos do relatório do órgão foram “pinçados” para “distorcer” o estudo. “Além disso o relatório vem corroborado por um laudo antropológico vasto, uma pesquisa muito séria, com documentos históricos, bibliográficos, que comprovam a presença [dos Kariri no local]”.

Um laudo pericial de 2012 constante no processo atesta a presença de 1.900 indígenas na região que teriam direito ao território, mas hoje já são cerca de 4 mil vivendo na área já delimitada, de acordo com lideranças da etnia. “Ele [o advogado dos produtores] fala que [a demarcação] vai prejudicar 100 famílias. E quantas famílias nós temos sendo prejudicadas há mais de 10 anos, desde que foi feito processo administrativo?”, questiona a líder professora Denízia Cruz.

A procuradora Marília Moraes disse que a AGU vai aguardar a publicação do Acordão com o resultado do julgamento para definir os próximos passos. “A gente vai aguardar para avaliar se vai recorrer do Acordão ou acolher o retorno dos autos e dar prosseguimento”. Segundo ela, caso a área seja demarcada, os não-indígenas serão retirados da área e indenizados pelas benfeitorias nas propriedades, mas não pela terra.

Já os pequenos agricultores que se enquadrem na política de assentamento rural serão realocados em outra terra pelo governo federal. A procuradora diz que há 64 famílias não-indígenas na área, e não 100, como os fazendeiros alegam. 

ABr




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