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Terça, 19 de julho de 2016, 09h17

A influência do ambiente nos 'princípios ativos' das plantas medicinais


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Chamada popularmente de “margaridão”, a Tithonia diversifolia é uma espécie invasora da família dos girassóis (Asteraceae) que se adaptou perfeitamente aos ecossistemas tropicais e subtropicais de três continentes: Ásia, África e América. Suas propriedades terapêuticas, há muito conhecidas pela medicina tradicional em diferentes países, vêm sendo reconhecidas por estudos científicos rigorosos. Atividades anti-inflamatória, analgésica, antimicrobiana, antiviral, leishmanicida, inseticida e outras são reportadas pela literatura especializada.

Essa pletora de ações medicinais decorre dos metabólitos secundários presentes na espécie. A função dos metabólitos secundários na dinâmica das plantas ainda não é de todo compreendida pela ciência. Grosso modo, pode-se dizer que, enquanto os metabólitos primários (proteínas, carboidratos etc.) são essenciais para a manutenção e a reprodução da vida, os secundários (terpenos, fenóis etc.) atuam como uma espécie de interface química entre a planta e o ambiente, desempenhando papéis como os de antioxidantes naturais, fungicidas, repelentes de insetos etc. Daí sua utilidade para os humanos.

Um novo estudo sobre o efeito das condições ambientais no perfil metabólico da Tithonia diversifolia acaba de ser publicado no jornal online Scientific Reports, do grupo Nature: “Effect of the environment on the secondary metabolic profile of Tithonia diversifolia: a model for environmental metabolomics of plants”.

O autor principal do artigo, Bruno Leite Sampaio, é apoiado com bolsa de doutorado pela FAPESP: “Avaliação da variação sazonal dos principais metabólitos secundários e da atividade anti-inflamatória de extratos de Tithonia diversifolia (Helms.) a. Gray (Asteraceae)”.

“Bruno monitorou os fatores ambientais e os relacionou com os perfis metabólicos da planta. Uma analogia, no caso humano, seria rastrear, mês a mês, a alimentação ingerida, as condições climáticas, o gasto calórico etc. e relacionar essas informações com dados bioquímicos de componentes como colesterol, triglicérides, glicose e outros”, disse Fernando Batista da Costa, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FCFRP-USP), orientador do doutorado de Bruno Leite Sampaio e também signatário do artigo da Scientific Reports.

“Além de fornecer uma base muito sólida para a utilização medicinal da Tithonia diversifolia, esse trabalho estabeleceu um modelo que pode ser usado no manejo de várias categorias de plantas: alimentícias, medicinais, tóxicas etc. Existe, então, uma ampla aplicabilidade”, acrescentou Costa.

Com o objetivo de comparar os efeitos de dois ambientes diferentes, Bruno Leite Sampaio cultivou a Tithonia diversifolia no Horto de Plantas Medicinais da FCFRP-USP, no município de Ribeirão Preto, a 315 quilômetros de São Paulo, e na Fazenda Santo Antônio, no município de Pires do Rio, a 145 quilômetros de Goiânia.

“Para excluir o fator da variação genética, precisávamos que todas as plantas fossem idênticas. Então, no lote de Ribeirão Preto, produzimos todos os espécimes a partir de uma única planta-mãe. Seccionando pedaços do caule, geramos 48 mudas por estaquia, depois transferidas para o Horto de Plantas Medicinais. E repetimos o mesmo procedimento em Goiás, gerando 48 mudas depois transferidas para a Fazenda Santo Antônio”, informou Sampaio.

A produção de metabólitos secundários nas várias partes das plantas (raízes, caules, folhas, flores) foi monitorada, mês a mês, ao longo de 24 meses. Ao mesmo tempo, foram registradas as variáveis ambientais de interesse: macro e micronutrientes e outros parâmetros físico-químicos do solo; e dados climáticos (precipitação acumulada, umidade relativa do ar, temperatura e níveis de radiação solar), estes fornecidos pelo Instituto Nacional de Meteorologia.

“Não focamos o estudo na variação de biomassa, mas sim na produção e acúmulo de metabólitos, em especial os secundários, nas diferentes partes da planta. Esses metabólitos podem ser entendidos como respostas químicas das plantas às variações ambientais, com vistas à melhor adaptação ao ambiente. E são eles que constituem os chamados ‘princípios ativos’ que determinam a eventual utilização farmacológica da planta”, explicou o jovem pesquisador.

“Trabalhamos com um grande número de plantas para não retirar amostras (de raízes, caules, folhas e flores) sempre dos mesmos indivíduos, pois isso induziria nas plantas uma resposta química artificial. O que nos interessava era acompanhar as variações no metabolismo normal e não respostas metabólicas falsas, decorrentes da injúria mecânica sofrida. Então, fizemos as coletas de amostras segundo um esquema de revezamento, de forma que cada planta tinha parte de seu material coletado apenas uma vez por ano”, acrescentou.

As amostras foram transformadas em extratos. E submetidas a duas técnicas analíticas poderosas: a cromatografia líquida de ultraeficiência acoplada a espectrometria de massas de alta resolução (LC-MS) e a ressonância magnética nuclear (RMN) de hidrogênio. A LC-MS foi realizada em equipamento adquirido com recursos da FAPESP, por meio do Projeto Temático “Estudos morfoanatômicos, metabolômicos e moleculares como subsídios a sistemática de espécies de Asteraceae e acesso ao seu potencial farmacológico”, coordenado por Beatriz Appezzato da Glória. E a RMN foi feita na University of Strathclyde, em Glasgow, na Escócia.

De forma muito resumida, a espectrometria de massas possibilita determinar a massa molecular de cada substância detectada no extrato. A ressonância magnética nuclear permite saber como os átomos de hidrogênio participam das moléculas dessas substâncias – o que informa se suas cadeias são abertas ou fechadas, constituídas por ligações simples ou duplas, com anéis aromáticos ou não etc. Juntando os dois conjuntos de informações, obtém-se, nos casos de sucesso, a estrutura química das substâncias propriamente ditas. E, por decorrência, a identificação dessas substâncias, sempre auxiliada por comparação com os registros da literatura.

“A grande novidade apresentada pelo Bruno foi combinar os dados obtidos pelas duas técnicas analíticas em uma única matriz. Tal abordagem experimental se diferencia da que é normalmente utilizada para estudos de metabolômica ambiental. Isso possibilitou reduzir pela metade o número de análises, tornar o tratamento estatístico muito mais robusto e obter resultados mais fáceis de interpretar”, comentou Costa.

“Conseguimos determinar como os perfis metabólicos das plantas variaram ao longo do período de dois anos. E constatamos que as diversas partes das plantas responderam de forma diferenciada aos fatores ambientais. A produção de metabólitos nas raízes foi influenciada apenas pelos fatores do solo, ao passo que as partes aéreas (caules, folhas e flores) se mostraram muito sensíveis aos fatores climáticos (chuvas, temperatura etc.)”, concluiu Sampaio.  

Agência FAPESP




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