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Domingo, 15 de julho de 2012, 08h27

Experiência internacional é decisiva para grupos dirigentes


Boa parte da elite dirigente do Brasil teve formação acadêmica no exterior. Para se estabelecerem em altos postos políticos, esses indivíduos contaram com sólidas redes institucionais de abrangência internacional, de acordo com uma pesquisa extensa que analisou a trajetória intelectual e profissional de brasileiros que buscaram formação fora do país.

Uma das principais conclusões da pesquisa foi que os membros desse grupo dirigente - que nada tem de homogêneo socialmente ou intelectualmente - , ao regressar de seu período de formação no exterior, atuam como mediadores dos processos de importação e exportação de modelos institucionais das sociedades ditas dominantes.

Iniciado em 2007, o Projeto Temático “Circulação internacional e formação dos quadros dirigentes brasileiros”, financiado pela FAPESP e coordenado por Letícia Bicalho Canedo, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), envolveu uma equipe interdisciplinar com pesquisadores de áreas como História, Antropologia, Sociologia, Educação, Direito e Ciência Política.

De acordo com Canedo, o projeto foi fundamentado no banco de dados sobre bolsistas brasileiros que foram em busca de uma formação doutoral em instituições de ponta do exterior, produzido anteriormente pela mesma equipe de pesquisadores.

Contendo informações sobre estudantes e pesquisadores que haviam estudado no exterior com auxílio da FAPESP, do Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), o banco de dados foi criado com apoio dos acordos Capes-Cofecub, estabelecidosentre a Capes e o Comitê Francês de Avaliação da Cooperação Universitária com o Brasil (Cofecub). O banco de dados permitiu o estudo do fluxo de bolsistas brasileiros no exterior desde 1951.

Um dos objetivos do Projeto Temático foi reconstruir redese e alianças dos formadores de políticas públicas no Brasil dotados de competência escolar e técnica e entender como são alocados os recursos sociais e institucionais que os capacitaram a participar das práticas de negociação no mundo globalizado. Segundo Canedo, o projeto deverá contribuir para enriquecer as futuras reflexões sobre o significado da circulação e da recepção de ideias e pessoas na transformação das instituições nacionais.

“Grande parte da nossa elite dirigente passou por uma especialização internacional. Nosso objetivo era entender como esse processo se relaciona com a construção da ‘globalização’ – ou do chamado ‘projeto universalista’ – e em particular ao estabelecimento de princípios de governo ‘universalistas’”, disse Canedo à Agência FAPESP.

A partir do uso dos bancos de dados disponíveis, os diversos estudos vinculados ao Projeto Temático problematizaram a atuação dos agentes internacionais a partir do enfoque de uma Sociologia da Globalização. “A temática da globalização sempre esteve na mão dos economistas. Faltava trazê-la para a perspectiva dos historiadores, sociólogos e antropólogos”, apontou Canedo.

Além de utilizar o banco de dados formado pelos estudos anteriores, os participantes do Projeto Temático empregaram os mais variados métodos e técnicas de pesquisa – em especial entrevistas – e consultaram fontes diversas para análise qualitativa da produção intelectual e das tomadas de posição públicas dos agentes vinculados ao espaço estudado.

Devido à complexidade do tema, a equipe mobilizou uma rede de pesquisadores internacionais, incorporando durante os cinco anos de trabalho, questões, métodos de investigação e técnicas de processamento de dados de pesquisadores que atuavam em países como França, Argentina e México.

“A globalização é frequentemente entendida como um processo acabado, mas, com base nas pesquisas anteriores, achamos que se trata de um campo de poder em construção. Os consultores internacionais nos ajudaram a dar essa perspectiva, evitando tratar como um movimento único diversos fenômenos ligados à globalização”, explicou Canedo.

Estratégia internacional

A formação do discurso da globalização foi analisada a partir do estudo dos grupos dirigentes brasileiros. A hipótese central da pesquisa foi formulada a partir de um conceito de “estratégia internacional”, proposto por Yves Dezalay, do Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS), na França, um dos consultores internacionais do Projeto Temático.

“O conceito de ‘estratégia internacional’ se refere à forma pela qual os indivíduos usam capital internacional — títulos universitários, conhecimento técnico, contatos, recursos, prestígio e legitimidade obtida no exterior — para construir carreiras em seus países de origem. Utilizamos um conceito capaz de levar à compreensão da maneira pela qual as diversas formas de articulação do capital internacional foram rentabilizadas no espaço nacional brasileiro ou argentino e administradas no espaço internacional", explicou Canedo.

“Conseguimos demonstrar que a dita globalização provém de indivíduos que fazem parte de redes institucionais bastante extensas e que refletem os interesses de grupos hegemônicos ao contribuir para a aceitação de regras internacionais de condução das políticas públicas”, disse Canedo.

Ao mesmo tempo, esses indivíduos ingressam em um circuito que assegura a eles um lugar de destaque na construção da chamada governança mundial. “No entanto, por se tornarem protagonistas, esses agentes nunca colocam em causa essa governança mundial”, afirmou.

Segundo Canedo, a novidade introduzida pela vasta pesquisa é que seu esforço analítico, ao relacionar as características sociais de grupos que tiveram acesso a atividades marcantes de circulação internacional - como experiências escolares - tanto com as competências e recursos adquiridos por eles durante a estadia no exterior, como com os usos que fizeram desse arsenal no plano nacional.

Os estudos realizados no Temático mostram os impactos da aquisição da formação acadêmica internacional sobre o acesso que os indivíduos têm às redes globais. "Trata-se de uma espécie de função de intermediário, que lhes permite controlar o repatriamento de jovens doutores e a importação de novos instrumentos de análise, novas problemáticas, novas alianças de governo, além de transformar o espaço de circulação internacional em posse das vias de circulação entre diferentes grupos. Com isso, controla-se a formação de novos doutores, a importação de novas temáticas e as conexões com as redes governamentais", disse Canedo.

Conhecimento científico
Um dos resultados mais relevantes do Projeto Temático, segundo Canedo, consistiu em demonstrar como funciona o mercado internacional da produção de conhecimento científico. Esse trabalho terá seus resultados sintetizados no livro Estratégias educativas das elites nacionais no mundo globalizado, que deverá ser lançado em agosto.

Segundo a pesquisadora, embora já houvesse antes, na bibliografia sobre a formação das elites brasileiras, estudos sobre a ida para o exterior e a socialização dos grupos dirigentes brasileiros, o Temático contribuiu com um esforço analítico sem precedentes para articular o processo escolar e acadêmico de produção social dos experts e sua progressiva inserção nos setores públicos e privados de ponta.

“Além de dispor de muitos dados quantitativos, os estudos relacionaram as características sociais dos grupos que tiveram acesso a atividades marcantes no cenário internacional, incluindo experiência acadêmica e militância política. Os estudos analisaram as competências e os recursos adquiridos no exterior e os usos que foram feitos deles no plano internacional”, disse.

O conhecimento adquirido no exterior, segundo Canedo, frequentemente se desvincula de suas origens e é reinterpretado no Brasil. “Essa característica reforça nossa ideia de que é inconsistente uma concepção de globalização como um processo único”, disse.  

(Fonte: Agência Fapesp/Fábio de Castro)




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