Segunda, 10 de setembro de 2001, 13h52
Competição com outros vírus pode frear ação do HIV
Um vírus de hepatite pouco estudado pode combater o HIV, de acordo com dois artigos publicados esta semana na revista The New England Journal of Medicine (www.nejm.org).
Pacientes infectados com o HIV e com o aparentemente inofensivo vírus da hepatite G (conhecido tecnicamente como GBV-C) têm sobrevida maior do que os infectados apenas com o HIV. Isso levanta a possibilidade de que os dois vírus sejam competidores por células a infectar.
Ninguém pretende inocular pessoas, intencionalmente, com o GBV-C, mas os estudos podem ajudar a descobrir novas terapias.
A primeira pista de que o GBV-C poderia reprimir o HIV surgiu há três anos. Segundo os trabalhos, pacientes HIV-positivos portadores também do GBV-C tendiam a viver mais e a ter menos cópias do HIV no sangue do que pacientes livres do GBV-C.
Os dois novos estudos na NEJM acrescentam vigor estatístico à conexão entre HIV e GBV-C. E reforçam a idéia intrigante de que outros patógenos possam esclarecer o HIV.
No primeiro deles, Hans Tillmann, Michael Manns e colaboradores da Escola Médica de Hannover (Alemanha) verificaram que 33 pacientes com infecção ativa por GBV-C tinham uma carga viral 15% mais baixa. E que haviam vivido em média um ano a mais que outros 52 pacientes infectados apenas pelo HIV.
Outros 112 pacientes que tinham anticorpos para o GBV-C, mas não uma infecção ativa, estavam em situação ligeiramente melhor que pacientes jamais infectados. A diferença persistia mesmo em pacientes sob terapia anti-retroviral (coquetel), o que sugere que o efeito do GBV-C pode somar-se às terapias atuais.
O outro estudo, de Jinhua Xiang, da Universidade de Iowa (EUA), descobriu que acrescentar o GBV-C a células do sistema de defesa infectadas com HIV reduz os níveis do antígeno p24, indicador da infecção pelo vírus da Aids.
O HIV e o GBV-C, de alguma maneira, utilizam sítios [das células] e mecanismos similares para a replicação [reprodução], especula Manns. Isso quer dizer, segundo ele, que talvez não consigam reproduzir-se nas mesmas células simultaneamente. Descobrir como isso ocorre seria um passo crucial para desenvolver novas drogas capazes de bloquear a infecção pelo HIV.
Antes que alguma terapia possa ser derivada, é preciso encontrar o mecanismo por trás da descoberta. Steven Wolinsky, especialista em doenças infecciosas da Escola Médica da Universidade Northwestern, em Chicago (EUA), alerta que nenhum dos estudos provou que o GBV-C seja a causa da supressão do HIV.
Não há evidência de que os vírus estejam em competição. Ambos os grupos têm estudos clínicos e de laboratório em andamento para encontrar essa evidência causal, que lhes permita enxergar o fundo da caixa preta do HIV.