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Segunda, 01 de maio de 2017, 17h37

Recentes atos de violência no Sudão do Sul separam centenas de famílias


Sandra olha fixamente para uma família que se acomoda em um abrigo improvisado. Lágrimas correm em seu rosto encoberto por poeira, deixando rastros nas bochechas. Perto dela, milhares de pessoas estão sentadas no chão, exaustas. Os homens estão ocupados arrumando as lonas antes de a noite chegar.

Mães e meninas jovens se apressam para preparar mingau. Sandra está só, em meio a um mar de incertezas e emoções intensas. “Não tenho notícias dos meus pais e irmãos”, disse ela, aos prantos. “Prefiro nem pensar neles. Fico muito triste. Tenho medo de nunca mais encontrá-los novamente”.

Sandra, de 14 anos, fugiu de Uganda em abril depois de o exército sul-sudanês ter promovido um novo ataque contra a cidade de Pajok, forçando dezenas de milhares de pessoas a deixar seus lares e se esconder na mata.

Em uma semana, mais de 7 mil pessoas cruzaram a fronteira para Ngomoromo, em Uganda. Desse total, 600 crianças separadas de seus pais fizeram a perigosa jornada. Algumas são meninas que estavam distantes de casa coletando água ou lenha quando os ataques aconteceram. Outras são adolescentes que vendiam frutas e vegetais no mercado local, ou eram estudantes, como Sandra.

“Quando o tiroteio começou, eu estava na escola. Nós estávamos na aula de inglês. Fiquei com muito medo. Nunca havia escutado aquele barulho antes. O professor gritou para que todos saíssem correndo. Meus colegas e eu estávamos na frente. Ele foi o último a sair da sala para garantir que ninguém ficasse para trás.”

Sandra e seus colegas da escola chegaram a Ngomoromo dois dias depois de uma árdua caminhada pelo mato sem água ou comida. Ela ainda está vestida com o uniforme escolar que usava no dia do ataque.

“Quando chegamos aqui, encontramos muitas pessoas dormindo no chão. Algumas estavam sentadas na beira da estrada. Mas eu não conhecia ninguém”, disse.

Desde o início da emergência, a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) tem gerido uma força tarefa de proteção na fronteira com o objetivo de identificar e oferecer assistência às pessoas mais vulneráveis: sobreviventes de violência sexual, deficientes, idosos, mães solteiras, crianças separadas e menores desacompanhados como Sandra.

Trabalhando em parceria com representantes relacionados à causa do refúgio, a equipe do ACNUR em Ngomoromo conseguiu reunir algumas dessas crianças com seus pais e providenciou acolhimento familiar temporário para outras.

Sandra encontrou sua tia, mas as duas ficaram juntas por pouco tempo. “Eu queria que ela ficasse comigo, mas ela voltou para o Sudão no dia seguinte para procurar os meus pais”, contou Sandra. “Estou sozinha novamente”.

Christine Achan, de 26 anos, está sentada em uma empoeirada esteira de palha embalando seu filho recém-nascido. Mas em seu rosto, mal podemos perceber a felicidade de ter trazido uma nova vida ao mundo. “Agradeço a Deus por meu bebê ser saudável, mas não estou feliz. Eu não sei onde está o meu marido. Quem vai cuidar dos meus filhos? Eu não estou bem”.

Christine estava em sua última semana de gestação quando a violência despedaçou Pajok, onde ela trabalhava como professora. “Eu estava em casa me preparando para ir para a escola quando ouvi os tiros. Tudo aconteceu de repente. Eu fugi para o mato com eles e minha avó. Caminhamos por três dias sem comida nem água. Pensei que fosse parir no meio do caminho. Sentia muitas dores e fiquei com medo de perder meu bebê”, contou.

Christine deu à luz Anwech Varsity dois dias depois de ter chegado a Uganda. “Em meio a esse caos, encontrei minha irmã Beatrice. Ao menos eu tenho alguém para compartilhar meus temores. Meus filhos continuam perguntando sobre o pai deles. Eu disse que ele está vivo e que em breve estará conosco, mas estou com um mau pressentimento”.

Desde o início do conflito no Sudão do Sul em 2013, diversas famílias foram forçadas a se separar. Violência, fome e ataques indiscriminados contra os civis continuam provocando êxodo em massa, totalizando o número de 1,9 milhões deslocados internos e 1,7 milhões de refugiados.

Atualmente, Uganda abriga mais de 834 mil refugiados sul-sudaneses, sendo que 194 mil chegaram apenas em 2017. Desses, 86% são mulheres e crianças, incluindo 21 mil menores sem pais ou guardiões legais.

“Mulheres e crianças carregam o fardo dessa guerra sem sentido”, afirmou o representante do ACNUR em Uganda, Bornwell Katande. “Além de ser essencial buscar uma solução política para o conflito, em países de refúgio como Uganda é fundamental oferecer apoio especial para mulheres e crianças que foram expostas a atos de violência, traumas e abusos. Porém, a situação financeira traz ainda mais desafios”.

O ACNUR e seus parceiros precisam de mais de 558 milhões de dólares para atender às necessidades dos refugiados sul-sudaneses em Uganda, incluindo alimentos, água, abrigos e meios de subsistência.

“Nos primeiros quatro meses de 2017, recebemos menos de 10% do financiamento. A comunidade internacional deveria compartilhar mais a responsabilidade sobre a crise de refugiados que cresce mais rapidamente no mundo. O que está em risco aqui é futuro de uma geração inteira de crianças, que perderam um ou os dois pais, que estão impossibilitados de ir à escola ou de fazer atividades comuns a todas às crianças”.

 




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