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Quarta, 05 de março de 2014, 21h05

Entenda a crise na Ucrânia


 De um lado, uma crise econômica e um país que precisa de empréstimos de US$ 35 bilhões para evitar uma falência estatal; do outro, uma crise política causada por um problema de identidade: se aproximar da União Europeia ou ser parte do plano de Vladimir Putin de construir uma União Eurasiana?

A Ucrânia está dividida: a metade ocidental é pró-europeia, enquanto a metade oriental é mais ligada à Rússia. “Há pelo menos duas culturas que tentam coexistir dentro de uma nação”, destaca o cientista político da Universidade de Rhode Island Nicolai Petro.

Antes de recusar assinar um acordo de livre comércio com a União Europeia, Viktor Yanukovich se alinhou com uma proposta mais generosa de Vladimir Putin: US$ 15 bilhões para investir em infraestrutura e mais US$ 2 bilhões anuais em abatimento no preço do gás que a Rússia fornece e do qual a Ucrânia é totalmente dependente.

O cientista político e professor de relações internacionais de Escola Superior de Propaganda e Marketing Heni Ozi Cukier explica que a Crimeia se tornou foco de tensão entre Rússia e Ucrânia porque a região nunca pertenceu propriamente à Ucrânia, mas durante a Guerra Fria, ela foi anexada, porque a União Soviética controlava tanto a Ucrânia quanto a Crimeia. E hoje, a maioria da população da Crimeia é de origem russa.

“É um ponto estratégico para os russos, porque você tem uma base naval importante, onde está a frota do mar de saída para o Mar Negro. Para os russos controlarem a Crimeia, é muito fácil. A pergunta-chave é: onde os russos vão parar? Será que eles vão se satisfazer em anexar a Crimeia ou ajudar sua independência, ou vão partir para outras partes da Ucrânia, principalmente o leste, que está muito mais aliado à Rússia?”, questiona o cientista político.

Heni Ozi acrescenta que os russos nunca aceitaram que a Crimeia não fizessem parte de seu território, porque a Crimeia fazia parte da Rússia há muito tempo.

A crise na Ucrânia, centro de uma disputa entre Europa e Rússia, envolve o gás natural, que abastece um quarto do continente europeu. Os russos estabelecem o preço e com frequência ameaçam suspender o fornecimento. Em 2006 e em 2009, eles fizeram isso.

O enviado especial da GloboNews Marcelo Lins explicou, da Sibéria, a questão econômica. “A confusão que tomou conta dos mercados financeiros mundo afora nos últimos dias parece dar bem a dimensão dos potenciais efeitos de uma crise ucraniana prolongada. Qualquer observador mais atento pode perceber que a posição russa nesse momento está longe de ser das melhores. Por mais críticas que recebam do Ocidente, Moscou tem na verdade essa carta valiosíssima na manga que é formada pelo petróleo e gás”, destaca o enviado especial.

Marcelo acrescenta que, em alguns casos como na Alemanha, o volume de gás natural fornecido pela Rússia passa dos 40%. “A Alemanha tem a noção bem clara do quanto depende das Rússia no que diz respeito às suas necessidades energéticas e sabe muito bem que a interrupção do fornecimento de gás russo teria efeitos catastróficos sobre a sua economia. O aumento dos preços de óleo e gás nos últimos dias e a desvalorização do rublo, que fez os exportadores russos ficarem mais competitivos, não deixou a Rússia em condições piores”.

Nesta terça-feira, 4 de março, Putin disse que Ucrânia sofreu golpe de Estado. Ele pareceu determinado em demonstrar que mantém a calma e o controle da situação e disse que não tem a pretensão de ter de volta a Crimeia anexada ao território russo, que não quer forçar uma divisão da Ucrânia, nem quer declarar guerra aos vizinhos.

Putin disse que concorda com todas as demandas e as críticas feitas na ruas pelos manifestantes que ocuparam Kiev por dias. E foi até mais além, dizendo que o presidente deposto, Viktor Yanukovich, cometeu muitos erros e que havia no país um histórico de corrupção preocupante. Disse que aceitou recebe-lo e abrigá-lo no território russo por razões humanitárias. Ao mesmo tempo, afirmou discordar da forma como o governo de Yanokovich.

Putin afirmou ainda que, por mais que a Rússia esteja determinada em manter boas relações econômicas e políticas com a Ucrânia, até agora Moscou não tem em Kiev um interlocutor legítimo. Citando as manifestações pró-Rússia na Ucrânia, afirmou que o governo interino não controla todo o país e destacou a importância de que todos os ucranianos sejam ouvidos sobre os rumos que querem dar ao país.

A correspondente da GloboNews na Suíça, Bianca Rothier, esteve em Kiev no dia 19 de fevereiro. Ela conta que havia controle nos principais acessos à capital e que a polícia tentava barrar manifestantes de outras regiões que queriam chegar à Praça da Independência.

No fim daquela quarta-feira, o governo e a oposição assinaram uma trégua, que foi ignorada pelos manifestantes. Eles exigiam que Yanukovich deixasse imediatamente o poder. Na manhã do dia seguinte, atiradores de elite com armas automáticas abriram fogo contra os manifestantes, que revidaram. Muitos feridos foram levados para o hotel onde estava a imprensa. Bianca conta que o saguão parecia um necrotério. Onze corpos foram contados na recepção. Bianca Rothier passou 24 horas em Kiev e presenciou o dia mais sangrento no país desde o fim da União Soviética.

O governo ucraniano pediu ajuda aos Estados Unidos e aos integrantes do Conselho de Segurança para proteger seu território e a equipe de segurança nacional de Barack Obama discutiu as possíveis opções políticas para evitar um confronto. O professor e coordenador dos programas de relações internacionais do IBMEC, José Niemeyer, não acredita num ataque (uma ação direta de OTAN, aliados e norte–americanos), mas destaca que é preciso entender o posicionamento da Rússia no cenário internacional.

“Desde o fim da Guerra Fria, passando pelo momento de guerra ao terror, após o 11 de setembro e a crise econômica de 2008, que envolveu muito a União Europeia e Estados Unidos, o papel dos EUA ainda é preponderante como superpotência. Há cinco anos, a Rússia já começava a usar suas ‘espadas curtas’ em sua ação contra a Geórgia. A Rússia mostrou toda a sua potência militar e os EUA apoiaram a Geórgia via Otan”, explica José Niemeyer.

O professor acredita que é fundamental na região das ex-repúblicas soviéticas que a Rússia permaneça um país líder, e mantenha o orgulho russo para a comunidade internacional. Ele cita ainda a divisão de ucranianos entre a cultura ocidental e a russa.

Sobre os altos gastos na recente olimpíada de inverno, José Niemeyer explica que o evento faz parte de uma estratégia de política externa russa - de atuar tanto no campo do soft power, fazendo uma bela olimpíada, que abre a sociedade russa para outros povos, e ao mesmo tempo endurecendo na sua política externa no que tange os assuntos de segurança regional.
José Niemeyer acrescenta que a Síria também é um país onde a influência russa é clara.

Essa é a segunda vez em tempos recentes que os ucranianos protestam em massa contra o governo. Em 2004, o movimento conhecido como Revolução Laranja denunciou fraude nas eleições para presidente naquele ano, praticada justamente pelo atual ocupante do cargo, Viktor Yanukovitch. Os manifestantes já acusavam o governo de ligações estreitas demais com Moscou e exigiam novas eleições.

Um segundo pleito levou à vitória de Viktor Yuschenko e sua então aliada Yulia Timoshenko como primeira-ministra. Mas os dois acabaram brigando. O novo presidente não se mostrou capaz de resolver os problemas econômicos do país e acabou perdendo o cargo três anos depois, quando Yanukovitch saiu vitorioso das urnas. Timoshenko foi acusada de corrupção, julgada e condenada à prisão, onde está até hoje, sob protesto de que foi vítima de um julgamento político.

O problema é que existe uma parte considerável dos ucranianos, no leste e no sul, mais identificados com a Rússia. Eles falam o idioma, seguem a cultura e se beneficiam mais dos laços econômicos herdados da época soviética. Para essa parcela numerosa da população, estimulada por Moscou, aproximar-se da União Europeia é um equívoco e os manifestantes deveriam ser reprimidos.

O presidente Yanukovitch, originário do lado do país com orientação russa, tenta equilibrar as exigências de cada lado, sob forte pressão de todos, dentro e fora da Ucrânia. Europeus e americanos agem unidos na missão de atraí-lo à esfera geopolítica e econômica do Ocidente, em troca de ajuda e empréstimo do Fundo Monetário Internacional.

Alguns analistas acham que a saída para Yanukovitch, interessado em um segundo mandato presidencial em 2015, é praticar uma acrobacia diplomática ao estilo dos ditadores africanos que, durante a Guerra Fria, jogavam Washington contra Moscou para receber benefícios dos dois. “Num cenário ideal, que eventualmente os futuros líderes ucranianos vão encontrar, o país vai ter relações com a Rússia e a União Europeia. Esperar que a Ucrânia sacrifique a relação com a Rússia para se juntar à União Europeia ou vice-versa não é realista ou pragmático”, afirma Lilit, destacando que a situação econômica ucraniana vai ser um fator fundamental para a construção de relações diplomáticas.

(GloboNews)




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