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Justiça e Direito
Quinta, 07 de março de 2019, 17h05

Sem preconceitos: surdos que trabalham no Judiciário investem na formação superior


A atuação de 36 surdos no Setor de Sobrestados da Secretaria Auxiliar da Vice-Presidência e na Divisão de Feitos Cíveis e Criminais do Departamento Judiciário Auxiliar (Dejaux) do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem surtido resultados significativos. Além de proporcionar acessibilidade a pessoas com deficiência auditiva no mercado de trabalho, o Poder Judiciário possibilita a inclusão social e humaniza a relação desse grupo de funcionários da Unilehu, empresa responsável pela contratação dos surdos e intérpretes.

Muitos desses jovens e adultos estão experimentando o primeiro emprego, e, de acordo com a psicóloga Amanda Roldão, com desenvoltura e rapidez. “Aqui, o trabalho, além de ser em um ambiente excelente, é especializado. E o que é interessante é que aprendem como ocorre o desenvolvimento dos processos no Judiciário”, diz Amanda, assinalando que os funcionários que tiveram outros empregos chegam a afirmar que experimentaram situações de discriminação.

Como não foram alfabetizados na Língua Portuguesa, a maioria dos surdos enfrenta dificuldades quando escreve. Mas, esse obstáculo, na visão da psicóloga, tem sido vencido com maestria. Contrariando o que poderia ser uma cultura de dificuldades e de preconceitos, no grupo de surdos que trabalham no TJ há tecnólogos em cursos superiores de curta duração em Química, Recursos Humanos e Engenharia de Alimentos, e também um bacharel em Biologia. E, agora, outra integrante da equipe foi aprovada, por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2018, para cursar Matemática na UFMT.

Outra história que ilustra bem a persistência de uma pessoa com deficiência auditiva para vencer barreiras é a de Scarlett Ysla dos Santos Sá. A jovem, de 22 anos, trabalha no Setor de Sobrestados da Vice-Presidência no período da manhã, à tarde cursa Letras/Libras, na UFMT, desde 2018, e à noite é estudante do Curso de Estética e Cosmética da Universidade de Cuiabá (Unic). Está no último semestre e a colação de grau deve ocorrer em julho.

Nasceu ouvinte e com pouco mais de um ano de idade, por conta de meningite bacteriana, ficou surda. Scarlett se diz feliz com a condição e que não se importa com discriminação. Filha única, a jovem fala que o convívio familiar é de muita tranquilidade e equilíbrio. A mãe estudou Libras para que pudessem se comunicar e o pai, apesar de não saber todos os sinais, entende e compreende.

Quanto ao futuro, como esteticista, está fazendo planos, mas acredita que investirá em massagem corporal. Segundo ela, desde criança gostava de trabalhar com as mãos. Como os demais surdos, também enfrenta dificuldades com a Língua Portuguesa e chega a dizer que existem palavras muito difíceis. Só não se abate e avisa que faz de tudo para aprender. E nas folgas das aulas, principalmente na companhia do namorado, que também é surdo, gosta de ir ao cinema e ao shopping.

A mais nova caloura da turma de estudantes de graduação, que faz parte da equipe de surdos, é Gabriela Karoline Abraão Rodrigues, de 19 anos. Foi aprovada para Matemática na UFMT. Diz que gosta de exatas e vai se formar para ser professora de surdos. A intérprete de Libras Jéssica Duarte, que participou da entrevista, revela que Gabriela é muito atenta e esperta. “Ela chegou ao grupo em outubro do ano passado, e, apesar de ser o primeiro emprego, tem desenvoltura considerável”, sustenta.

Em casa, é a única surda e a comunicação com os pais e os dois irmãos é tranquila. No início, quando criança, utilizava muito gestos e expressões. “Meu pai fez curso de sinais e fala um pouco”, frisa Gabriela Karoline. Outra façanha da jovem é estudar japonês desde 2015, quando conheceu na internet um rapaz daquele país que também é surdo. Uma das vontades dela agora é conhecer o Japão.

E, pelo jeito, desafio é um substantivo que faz muito sentido na vida de Gabriela. Desde o ano passado namora um rapaz ouvinte. Eles se conheceram no facebook e o primeiro encontro foi em um shopping center da Capital. Segundo ela, o namorado, que também vai fazer curso superior na área de exatas, está aprendendo a língua de sinais.

Sidnei Fernando Francisco, de 41 anos, também é um dos destaques dos surdos que atuam no Tribunal de Justiça, no Setor de Sobrestados da Vice-Presidência. Ele é natural de Goiânia e há algum tempo está em Cuiabá. Aqui, na Capital mato-grossense, conheceu a mulher que é mãe de dois surdos. Eles se casaram e, além de dois enteados, sendo que um deles é o namorado da Scarlett, tiveram uma filha que está com oito meses.

O goiano conta que a filha é ouvinte e já está aprendendo os sinais. “Ela vai apreender Libras e depois a Língua Portuguesa”, planeja. Sidnei fala com propriedade e com base nos estudos. Ele está a poucos meses de concluir Pedagogia e o interessante é que o intérprete de Libras no Tribunal de Justiça também acompanha Sidnei na instituição de ensino superior.

Jeymeson Petrick Silva de Araújo, como intérprete, ganhou uma bolsa de estudos e também vai se formar em Pedagogia. “Faço matemática na UAB (Universidade Aberta do Brasil), no IFMT (Instituto Federal de Mato Grosso), e estou tendo essa oportunidade de trabalhar com o Sidnei e conquistar minha primeira graduação”, evidencia, salientando que o Sidnei é um aluno muito aplicado. “Ele não falta às aulas e interage com facilidade com os colegas ouvintes”, manifesta Jeymeson.




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